A política deve ser um instrumento aberto e participativo para a resolução de problemas e, consequentemente, para garantir a justiça. O melhor governo deve permitir aos seus cidadãos perseguir e realizar as atividades inerentes a uma vida justa e equilibrada. Não é o suficiente ter uma coleção de indivíduos vaidosos que querem expor e impor as suas querelas particulares como problemas públicos.
Em vez disso, esses indivíduos devem ser capazes de colaborarem uns com os outros em público, reunirem-se em um espaço público-político, de modo que suas diferenças possam tornar-se objeto de debate democrático. Ou então, redesenhar a fronteira do que é público e do que é privado, porque o que se vê hoje são muitos dos chamados problemas particulares tornando-se preocupações públicas.
O espaço da aparência é uma teoria da filósofa Hannah Arendt, que sublinhou a artificialidade da vida pública e das atividades políticas em geral, propondo que nas cidades existissem um espaço destinado ao discurso livre e honesto, sem a interferência de argumentos e diferenças particulares. Assim, no espaço da aparência todos teriam igual acesso, no sentido de que os participantes deveriam ser capazes de colocarem-se no debate político como seres políticos iguais. A inspiração é que os cidadãos se reúnam como iguais para debater as questões do dia e para tomar decisões de interesses coletivos.
No espaço da aparência os indivíduos conhecem uns aos outros, respeitam-se e são capazes argumentar, rebater as diferenças e procurar alguma solução coletiva para os problemas, a partir de diferentes perspectivas. Isso é a liberdade. A chance de subir ao palco político, de atuar num universo aberto, transparente. Favoreceria a manifestação dos cidadãos, que precisam de acesso para as possibilidades de engajamento e de bases sobre as quais possam interagir, estabelecendo relações de reciprocidade e solidariedade, com suas identidades reveladas, sem máscaras.
É justamente devido a impossibilidade prática de recriar esses pontos de encontro no mundo moderno, que a visão de Arendt encanta. Imagino um espaço onde posso aparecer para os outros como outros aparecem para mim. Imagino um espaço de diálogo, onde o governante apresenta-se baseado nos princípios da igualdade e cidadania e o indivíduo comum, no direito de contribuir para o debate, apresentando sugestões, teria a oportunidade de colocar-se na esfera pública, como um ente também político. Por outro lado, também imagino que teríamos que reinventar um significado para a palavra aparência, no texto utilizada como expressa manifestação da realidade, porém desgastada, hoje é ligada à coisas da superficialidade, de natureza fugaz.