A humanidade aparentemente já foi menos ansiosa. Já teve uma vida mais estável e segura, embora o progresso não seja linear no que diz respeito à felicidade humana. Parece que estamos sempre nos movendo de tempos mais felizes para tempos menos felizes e de menos para mais felizes. É cíclico. Só que os medos e as infelicidades de agora são de outra ordem. A tensão pode ser estrutural e permanente, mas a busca da felicidade, da reinvenção do cotidiano, de um projeto de vida, da construção de uma identidade fixa nesse mundo efêmero, é sem dúvida, uma decisão ensandecida e necessária..
Ao cotidiano precisamos acrescentar mais tempero, mais sonho e senso de humor, para sobrevivermos nessa nau apertada que embarcamos e agora encurralados procuramos culpar o destino ou arranjar um deus para ser nossa desculpa e para esclarecer os enigmas que nossa ignorância não consegue decifrar. É bom recordar que não devemos tomar os outros por idiota, por fraco, por “sem eira nem beira”, pois que caminhamos com passos regulares ou ziguezagueantes em cima do mundo que habitamos e desconhecemos a natureza e as pessoas e a natureza das pessoas.
Embora eu questione sistematicamente o nosso modo geral de vida, não tem sido fácil entender o que faz as pessoas serem o que são, conhecer o que pensam, os dilemas que enfrentam, suas alternativas. Muito pouco também se pode aprender com teorias distantes das experiências diárias, que seleciona e expõe somente uma pequena parcela da condição humana, dos limites das ilusões, a futilidade de sonhos, enfim, sobre as ambições humanas que, no final, se revelam ilusórias e impotentes. Mas isso é o que há sobre o momento que vivemos. Não podemos exibir outra realidade, com mais nitidez, harmonia. Não podemos fazer nosso mundo caber num espaço menor que nossas ambições, prometer soluções simples e falsas para uma busca impelida pela complexidade. Porém, mente quem declara que as contradições e as incompatibilidades são irremovíveis da vida humana. Essa é nossa luta!
A sociedade atual tem uma dinâmica própria e embora minhas apreensões possam parecer incompreensíveis, as reflexões não vergam apenas sobre mim, pois tenho pensado no mundo plural, no homem inumerável, que persegue uma linha de fuga para escapar de uma existência condenada ao conformismo. Não sendo o dia-a-dia semeado por maravilhas, seria isso a modernidade líquida descrita por Baumam, numa entrevista que acabo de ler, que nos condena a viver num mundo em que o chão pode, de repente, se abrir sem que haja nada no que segurar?