Sem esforço para agradar

O ser humano é quem controla a máquina, todas. Com um olhar atento, percebo que há um certo comportamento manipulador nos relacionamentos reais e virtuais, um movimento estranho de nos colocar contra a parede para termos respostas prontas, posicionamentos de manada, esboçarmos atitudes recriminatórias, julgamentos.

Quando percebo que estou me esforçando demais para agradar, para ser compreendida, recuo. As conexões devem ser estabelecidas com base no respeito mútuo, no encantamento das trocas, senão, vira isso que acima citei; manipulação.

Não se exerce o poder sem consequencias. Pronunciamentos políticos, massacre de publicidade e muitos cidadãos parecem satisfeitos com o destino dos bombardeios das mensagens e tentam agradar, reproduzindo, compartilhando ideias que não representam seu pensamento verdadeiro.

É estranho, porém acontece de pessoas buscarem certeza e segurança intelectual no mundo de pessoas de conhecimento indiscutível, porquanto existe dificuldade em se manter fiel a própria identidade, devido à ausência de pontos de referência sólidos.

Ser indivíduo significa dispor de uma certa margem de liberdade para concordar e discordar, para criticar e para calar. A concordância intermitente nos torna irrelevantes e depois, não temos a necessidade dessa homogeneidade nacional, num momento em que propício seria, começar a pensar além da nossas próprias causas individuais, tanto na vida pública quanto privada.

Eu sei que você sabe, mas sejamos claros: é absolutamente vital que se estabeleça uma nova ordem de honestidade, de integridade e conversa reta sobre a política e políticos e sobre o futuro do nosso país e sobre isso não precisamos seguir outros, sentimos na pele as consequências da corrupção, da falta de investimentos em saúde, segurança e educação, pelo menos.

Anotações de um curso sobre política feito com Gaudêncio Torquato, anos atrás, relembra-me que a estratégia de bombardear as pessoas com anúncios políticos destinados a evocar insegurança é muito arcaica para servir a uma democracia estável, do século 21.

Vamos partir rumo a uma nova definição de integridade e criar grupos e redes de soluções, onde as pessoas se reúnem não apenas para apontar erros, mas para difundir ideias. Somos uma pequena parte numa solução maior e tenho vivenciado pessoas se reunindo em seminários, conferencias, incentivando redes que já estão se movimentando, promovendo bons debates.

Se por um lado não devemos ser como uma folha, deixando que cada vento mude sua posição; por outro lado, devemos estar abertos a novas provas.

Moralidade calibrada

Estamos fazendo política com raiva? Sinto que há neste momento uma ligação íntima e complexa entre a raiva e a política. A prática de fazer política com ódio não é só aceita, mas defendida por várias correntes filosóficas, que entendem que a amabilidade e não-violência não são instrumentos aplicáveis na política.

Argumentam que a raiva política tem um papel fundamental a desempenhar e é necessária para acentuar e promover mudanças profundas. Tenho dúvidas!
Porém, lendo o ensaio sobre a raiva, de Seneca, decido crer que a raiva política é um problema filosófico que podia ser tratado pela argumentação, com debates enriquecedores. A ira que ronda o congresso nacional, as faces de ódio que são exibidas, as palavras de efeito cortantes são frutos podres de uma árvore que detém ideias ora racionalizadas demais, ora radicais sobre o comportamento das pessoas e sobre o mundo.

E o problema delas segundo a avaliação negativa de Sêneca é que estas pessoas criam expectativas de dominação demais. O congresso nacional está sendo conduzido sob um ataque de ira, com a casa fechada a presença popular e seu o presidente passa o dia atacando todo mundo.
O que Sêneca diria é que, as confusões, injustiças e barbeiragens lá cometidas não são surpreendentes dado ao perfil dos que lá colocamos. Assim, seu primeiro conselho seria que fôssemos mais pessimistas ao ajustar nossa visão de mundo aos reveses da vida.

A onda de conservadorismo extrapolou no Congresso Nacional, com os discursos moralizadores, propondo restrições aos avanços que pareciam historicamente consolidados no Estatuto da Família, restringindo a constituição da família apenas com a união entre um homem e uma mulher; na questão da proteção jurídica aos embriões, na cura gay, entre outras medidas. Não nos surpreendamos se o Congresso pautar votação de medidas restritivas contra o rock, alegando que este tipo de música cria uma escada que desvia do caminho do céu.

É a cultura de demonizar o outro, vilipendiar as crenças que asseguram a compreensão e respeito as liberdades individuais. Há certo cinismo no ar quando falam de Estado laico e estão a derrubar os avanços conseguidos a duras penas, em nome de uma moralidade falsa e eleitoreira.

Sabemos que não podemos moldar o mundo de acordo com nossas convicções e retorno a Sêneca e a uma comparação que ele faz no ensaio citado. Disse que somos, como cães amarrados a uma carroça em movimento. A coleira é longa o bastante para termos alguma liberdade, mas não permite que cada um vá para onde quer. O cão logo se dá conta que ele precisa se contentar em seguir a carroça e que é bem melhor segui-la do que se debater contra algo que não se pode mudar e acabar se estrangulando.

Contudo, as noções de Seneca sobre raiva encontra amparo na maioria dos códigos morais e religiosos: a raiva é um dos sete pecados do catolicismo; é igualada com o desejo não correspondido no hinduísmo; é definida como um dos cinco obstáculos no budismo; no judaísmo, a raiva é considerado um traço negativo; e no Alcorão, a raiva é atribuída aos inimigos de Maomé.

Talidade

Os homens, indistintamente  desejam ter uma vida feliz e trabalham muito para conquistar liberdade, viver uma vida justa, o que  significa, no final das contas, viver feliz.

Os antigos gregos pensavam que o bem era a própria felicidade. Aristóteles dizia que o bem do homem, a felicidade, era uma atividade da alma.

A felicidade para Platão era ascender aos céus, igualar-se aos deuses. O homem deveria buscar a harmonia absoluta, ser governado somente pela razão e evitar as interferências das experiências sensíveis.

Na idade média e na era moderna, esse pensamento foi alterado para um significado mais material, onde a felicidade é prazer ou ausência de dor. Outros filósofos fazem distinção entre felicidade e prazer dizendo que felicidade é permanente e universal, enquanto que o prazer é transitório.  Spinoza diz que felicidade não é a recompensa da virtude, mas a virtude em si.

A felicidade de Bauman não é divina e nem diabólica, mas um meio termo quase impossível. Bauman propôs um plano que prevê conscientizar as pessoas de que o crescimento econômico tem limites; convencer os capitalistas a repartir os lucros em função dos benefícios sociais e ambientais e mudar a lógica social dos governos, para que os homens enriqueçam suas existências por outros meios, que não seja só material.

Materialmente, alguém é feliz porque é rico, goza de conforto. Já felicidade mental e espiritual relaciona-se com a amizade, amor, harmonia. Essas condições de felicidade dependem de causas externas, onde a felicidade é vivenciada ao se ter algo ou receber algo de alguém. Dessa maneira, quando a causa da felicidade cessa, a felicidade também desaparece, justamente por estar além de nosso controle.

Mesmo a felicidade que vem do amor, da amizade, simpatia e bondade não é algo que de que se possa depender, pois o amor frequentemente se transforma em outro sentimento, amigos se distanciam…

A vida nos ensina que o melhor é olhar para o centro das coisas ao invés de olhar ao redor, procurar a felicidade em si mesmo e não no mundo exterior e saber lidar com os incontroláveis acontecimentos lançados pelo destino.

Devemos olhar para dentro de nós mesmos a fim de constatar o que cria a felicidade;  encontrar o caminho do amor ao invés do caminho de ser amado. Este é o mundo da Talidade. Ver coisas como elas são. A verdade como ela é, a felicidade em seu natural. Talidade é o mundo livre da artificialidade, onde uma rosa é uma rosa e o homem é o homem.

O homem moderno usa máscaras demais. Devemos tirar as máscaras e sermos nós mesmos, de maneira sincera e honesta e, assim, viver verdadeiramente com as limitações que nos caracteriza, pois, o rumo do que deve ser uma experiência preciosa, nunca erra

Pequenos delitos

Não somos limitados pela situação que nos encontramos, mas pela atitude que adotamos. As pessoas se sobressaem quando tomam atitudes inesperadas, que causam grandes impactos sobre a vida de outras pessoas; são inspiradas e motivadas a desviarem-se dos processos e práticas testadas, partindo do princípio básico de que se você optar por fazer as coisas da maneira que todo mundo faz, obterá os mesmos resultados dos outros.

Ninguém nunca mudou um grande cenário, fazendo o que todo mundo faz. Se o comportamento convencional das pessoas é irmanarem-se no erro, sejamos pois, inconvenientes.
Vivemos em um mundo onde o fim justifica os meios e isso não pode ser aceitável. Um indivíduo desonesto em qualquer aspecto da vida, vai ser desonesto todas as vezes que tiver oportunidade. Afinal, se uma pessoa não se pode confiar nas questões mais simples de honestidade, como poderia ser confiável em negócios maiores e mais complexos?

O que um exame sereno das circunstancias mostra é que a força dos maus hábitos não encontra, para resistir-lhe, a punição sistemática. Nota-se má fé no Parlamento que não vota as reformas necessárias e aprova as propostas que bem entende. Má fé dos opositores que ficam nas superficialidades e quando podem apontar os erros, temem ir ao fundo da ferida, afastando-se da conclusão que às coisas se compreende melhor quanto mais são discutidas à luz da honestidade. O mal único, o mal essencial, o mal a curar do Brasil é a falta de integridade e a forma como esta estabeleceu-se como advento intrínseco da cultura brasileira.

Nas práticas diárias em casa, nos cruzamentos das ruas, nas calçadas vê-se a despreocupação em corrigir-se, em reformar os hábitos corrompidos. O adesivo “Muda Brasil” está ainda grudado em carros que sobem a contramão da rua (de mão única) onde moro. E numa desenvoltura alarmante, espero que concluam seus delitos, para então, ter a oportunidade de entrar na garagem.

O consumo de produtos falsificados entre a classe média e alta foi objeto de pesquisa na disciplina Sociologia do Consumo, na UFMT. Michael Kors e Louis Vuitton “made in China”, percorrem corredores nobres da corte, com altivez e arrogância. Segundo um entrevistado, a classe alta não frequenta o shopping popular, porém recebe as sacoleiras que invadem as repartições, onde pessoas com grandes salários se lambuzam às compras, procurando réplicas de modelos tradicionalmente caros para enganar ninguém, senão a si mesmas.

É uma compra sem nota aqui, um produto falsificado ali, um pneu só sobre a calçada, um olhar indiferente a quem precisa e assim, credita-se à cultura o comportamento deseducado e mal intencionado, que pode efetivamente ser corrigido. Basta querer e estas ranhuras do sistema corrompido, podem ser reparadas.
O mega investidor americano Warren Buffet disse que quando procura pessoas para contratar, ele se fixa em três qualidades: integridade, inteligência e energia. Porém se as pessoas não tem a primeira, as outras duas, as matarão.

Que coisa feia!

Incivilidade, falta de educação e atitudes inapropriadas tem sido o recheio da mídia nas últimas semanas. Mensagens carregadas de ódio, racismo, pessoas que desabafam seus sentimentos ofendendo, desprezando os outros, fazendo-se os donos da verdade, como os que seguram um carvão em brasa com a intenção de atirá-lo em alguém; mas enquanto isso, se queimam.

Sabemos que circulam entre nós pessoas abomináveis, que promovem julgamentos racistas, onde a cor da pele determina como a pessoa deve ser tratada pela vida. Um olhar sobre as estatísticas sugere que, apesar de tudo o que se avançou na questão de igualdade racial, honestamente, não importa para onde você olha, a raça ainda é um fator muito importante para determinar o tratamento que se dão às pessoas. É uma lástima, mas certas pessoas só entendem as coisas mediante suas acanhadas percepções

Tentaram explicitar isso à apresentadora de televisão que foi vítima de xingamentos racistas. Isso não configura crime?
Civilidade e educação continuam sendo parte de um discurso moderno de quem aprecia discutir igualdade racial, política e de gênero.
Mas o que dizer do tipo de pessoa que pratica um discursinho insosso e na falta de conhecimento das praticas democráticas e outras nem tão democráticas assim para se destituir um governo, atacam sordidamente, com falta de respeito e distribuição de adesivos ofensivos que ridicularizam a condição feminina da presidente da república? E se a foto fosse da sua mãe?

Longe de mim, achar que devemos limitar o discurso, seja de raiva ou não, de quem quer que seja, mas é uma carga tolerar o comportamento grosseiro e pouco civilizado de muitos. O comportamento incivilizado e descortês, especialmente em conversas políticas, merece considerável atenção para investigação.
Boa educação tem os que observam as normas morais e sociais, os que foram instruídos no respeito, na tolerância e na bondade. A civilidade, concentra-se mais nos valores da sociedade civil, nas práticas democráticas e na rotina do debate. Juntando os dois tem-se pessoas que a outros concedem direitos e oportunidades iguais e que tratam os irmãos como gostariam de ser tratados; indivíduos com conceitos robustos de democracia e de respeito.

O preconceito tem duas fontes, ensina o filósofo Mário Sérgio Cortella: a covardia e a tolice. O intolerante em relação a etnia, cor da pele, orientação sexual, religião e extrato econômico tem medo de ser o que é. Ele só se eleva quando rebaixa o outro. Necessita ver que o outro não serve e não presta para ele poder valer alguma coisa. É um fraco que teme aquele que não é igual e se sente ameaçado por ele.