A grande mentira da sociedade contemporânea

Aempatia é geralmente definida, no senso comum, como a capacidade de compreender e compartilhar os sentimentos do outro. Portanto, se você está com dor e eu sinto sua dor, se você está ansioso, eu vivo sua ansiedade, se você está triste e eu me entristeço e será exaustivo o peso que carregarei, estou sendo empática. E isso é diferente de compaixão. Compaixão significa que eu dou importância à sua preocupação, eu a valorizo, eu me preocupo com você, mas não necessariamente entro em seus sentimentos e na busca de solução para eles.

Muita gente pensa que isso é apenas uma distinção verbal, que não tem tanta importância, mas na verdade, os dois sentimentos têm consequências diferentes e nem todos os seres humanos são capazes de demonstra-los. A falta de compaixão e empatia foram expostas essa semana no episódio envolvendo duas médicas do estado do Amazonas, que gravaram um vídeo zombando das crianças que chegaram aos gritos numa unidade de saúde após serem atingidas por um raio. Mesmo diante do quadro das crianças, resolveram gravar um vídeo para as redes sociais. Elas riam debochadamente e uma delas disse que as crianças gritavam e se contorciam como se estivessem sendo exorcizadas.

A empatia é sobre colocar-se no lugar das crianças que aguardavam atendimento, ajudar cobrar providências, independentemente de você ter filhos pequenos porque o sentimento de empatia não é sobre você e seu entorno. Em suma, a empatia é ver o mundo de outra pessoa através dos olhos dela naquele momento e sentir na pele a dor que ela sente. Pode soar um pouco demais imaginar que existem pessoas que podem captar tão profundamente as vibrações de outras pessoas, debruçar sobre suas dores, mesmo diante da nossa predileção por relações ligeiras, onde há sempre algo que nos atrai para que não permaneçamos muito tempo parados na mesma notícia.

 Não importa como você defina empatia. Mas ela decorre do interesse de entender e conhecer o problema que aflige o outro. Tem a ver com conhecimento, com valores éticos e ação. Não precisamos de poderes intuitivos e mágicos para elevar outras pessoas, para nos colocar à disposição para ajudar e tentar reparar erros e injustiças. O que podemos fazer para ajudar pode importar muito mais do que como nos sentimos diante do drama dos outros. Ser emocionalmente sensível pode garantir a satisfação a você mesma, mas não garante que você tomará medidas necessárias para efetivamente ajudar alguém.

O terrível terremoto que abalou cidades da Turquia e da Síria produziu imagens que por si expressam a dor imensurável dos que agonizavam debaixo dos escombros e o desespero de familiares diante das buscas, a imagem da criança sendo alimentada com água numa tampa de garrafa, único objeto que cabe no exíguo espaço onde ela está presa. Esse tipo de imagem abala todos os seres humanos, acende a chama da compaixão, a empatia, no entanto, faz a pessoa ir além, a interessar-se pelas ações de resgate e pelo menos buscar no mapa a localização da tragédia, ler sobre as dificuldades encontradas pelas equipes de resgate para chegar ao local. Não se vira a página rapidamente diante de uma tragédia.

 A empatia, em tempo de vigilância on-line, pode ser apenas uma ilusão sedutora. Até porque, no fundo, tendemos a ser empáticos por aqueles que nos são semelhantes. Se temos filhos, nos sensibilizamos por fatos que ocorrem com crianças, se somos mulheres, tendemos a demonstrar mais empatia por situações vividas por mulheres. Na verdade, sentimos muito menos empatia por pessoas que não fazem parte da nossa cultura, que não compartilham nossa rede de conhecimento e relacionamento. Este é um fato terrível da natureza humana e talvez opere em um nível subconsciente, mas sentimos que isso acontece.

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