Em 2017, o historiador e escritor polonês, Karol Modzelewski, figura proeminente do movimento Solidariedade da Polônia, observou: “Agora existem duas Polônias. Recebemos as mesmas notícias mas não lemos os eventos da mesma maneira. Também não temos os mesmos valores. É como se estivéssemos perdendo nossa linguagem comum. Já não ouvimos uns aos outros e já não falamos uns com os outros. Pior, não queremos mais falar um com o outro”.
Um novo estudo sobre polarização política liderado por cientistas políticos da centenária Brown University, fundada em 1794 nos Estados Unidos mostrou que a polarização – percepções ideologicamente distorcidas da mesma realidade – é mais forte em pessoas com menor tolerância à incerteza em estágios gerais da vida. Isso estabelece que parte da animosidade e mal-entendido que vemos na sociedade não se deve a diferenças irreconciliáveis em crenças apenas políticas, mas depende do grau de incerteza que as pessoas experimentam na vida cotidiana.
As interpretações dos fatos carregados de ideologia distorcida trouxeram consequência terrível para nosso mundo político. Grupos políticos tornaram-se ideologicamente mais homogêneos, distintos e desconfiados das pessoas que seguem do outro lado e as imagens dos apoiadores tornaram-se ridiculamente estereotipadas, para seguir, agradar e mostrar identificação cega com o líder.
Esse recrudescimento ideológico foi trazido para dentro dos lares, para os estilos de vida em sociedade. A diversidade de convivência mingou. Não estamos mais falando apenas de uma política polarizada, mas de uma sociedade dividida onde liberais, progressistas e conservadores cada vez mais se segregam. As pessoas intolerantes e preconceituosas estão mais confortáveis para deixarem escapar ‘suas verdades’, como o pronunciamento gravado da advogada mineira ridicularizando os nordestinos. Todo mal extravasado no discurso sempre existiu na mente da advogada, o momento polarizado a deixou confiante para se expressar.
Não é um bom sinal para a democracia quando as pessoas começam a usar a política para justificar todos os ângulos da vida. O pluralismo político pressupõe que os indivíduos e seus padrões de relacionamento determinam suas lealdades políticas, mas com a política partidária em segundo plano, organizando interesses e identidades, mas não ditando a vida cotidiana e as relações sociais.
Em contraste, quando o partidarismo ideológico assume o controle e afeta substancialmente as relações sociais que as pessoas expressam em público, a polarização partidária se torna esse processo descontrolado, que estamos vivenciando.
É cedo para entender se a atual onda de polarização vai remodelar permanentemente o cenário político e social do Brasil, ou se, ao contrário, é uma paixão, que em breve vai passar.