Até quando as mulheres terão que se levantar todos os dias e perguntar: “Qual é a minha cruz?” A inauguração de um abrigo temporário para mulheres em situação de violência, inclusive, com o risco iminente de morte, é mais uma obra que se integra à Rede de Atendimento às mulheres brasileiras. A Casa da Mulher Brasileira, um espaço moderno, que oferece serviços especializados e multidisciplinares é assim como todos os demais espaços destinados a este fim, a constatação da vulnerabilidade e das desigualdades promovidas pela questão de gênero no país.
Embora campanhas de conscientização existam e os casos de violência estejam sendo julgados com mais celeridade, falta o compromisso de fortalecer a participação da mulher nos espaços de decisão. Percebe-se que não avançamos muito no Estado. Ano de 2015. De 24 deputados estaduais, apenas 1 mulher; entre o secretariado do Governo, 3 mulheres; de 21 vereadores, apenas 1 mulher; entre a bancada federal do Estado, nenhuma mulher.
O preconceito e a violência contra a mulher, causam indignação pela recorrência e perplexidade pela estagnação do pensamento que ainda permeia o tema. Na moderna América, onde o discurso de uma atriz falando em igualdade de gênero na questão salarial ainda causa arroubos, um deputado republicano do estado da Virginia fez uma declaração estarrecedora, durante a discussão sobre o acesso das mulheres ao sistema de saúde reprodutiva. Ele pedia um adendo de excepcionalidade no abrandamento da lei, nos casos de gravidez provocadas por ato de estupro. Inacreditavelmente o deputado disse que o estupro pode ser algo bonito se do ato nascer uma criança.
“Rape can be beautiful!” Esta observação fez ressoar uma série de afirmações políticas embaraçosas sobre o corpo da mulher, lembrando que anteriormente um senador já havia declarado que não existe gravidez fruto do estupro, porque quando o estupro é legítimo, o corpo feminino se encarrega de expelir o feto, evitando gravidez indesejada. Outro senador, tentando corrigir o incorrigível nas declarações dos outros, disse que as mulheres rotineiramente fabricam histórias de estupro para obterem vantagens.
Observações igualmente ignorantes ouvimos também de políticos brasileiros. Os temas ligados à questão de gênero nem sempre são discutidos dentro de um contexto de respeito e seriedade.
Do outro lado do mundo, neste mesmo fevereiro de 2015, na India, durante um vôo, após as luzes serem desligadas, uma jovem sentiu que uma mão subia-lhe as pernas. Um senhor de certa idade sentado ao seu lado, tentava apalpá-la. A jovem registrou a cena no celular, levantou-se e o repreendeu em voz alta, avisando-o que ao desembarcar formalizaria a denúncia. Visivelmente constrangido, o velho senhor tentava cobrir a face e num tom de súplica, pediu perdão.
Um ataque sob qualquer perspectiva do mundo contemporâneo, é um ato condenável e pronto! Até quando a secular luta contra a desigualdade e violência terá que ser engendrada?
Lembro-me quando li Erasmo em “A educação do príncipe cristão”, ele disse que as virtudes mais elevadas para um ser ideal, seriam as virtudes consideradas fracas: a clemência, prudência, gentileza, civilidade, sobriedade, temperança, integridade e a equidade. Talvez sejam estas as virtudes que nos faltam.