Por que comportamentos proibidos são tolerados no discurso público?
Dirigir embriagado é a segunda causa de morte no trânsito e o trânsito brasileiro é o quarto mais violento do continente americano. Cuiabá é a terceira entre as capitais onde mais se percebe o crime de beber e dirigir. Embora a lei ordinária do Código de Trânsito seja considerada boa e prevê penas que foram aumentando no rigor ao longo das revisões que sofreu, mesmo assim, as pessoas continuam bebendo e dirigindo sabendo de todos os riscos e consequências.
Os trabalhos de prevenção não tem sortido efeito no sentido de esclarecer o perigo do álcool. Há uma aceitação na sociedade para ver quem bebe mais. Quem mata com revolver vai imediatamente preso, quem mata com carro, quase nunca.
Naturalmente as pessoas tem resistências em obedecer algumas leis, e isso se manifesta por excesso de confiança, já fez isso várias vezes e nunca aconteceu nada. O problema é que as pessoas só mudam se algo acontecer no seu entorno. Pergunte a sua volta quantas pessoas elas conhecem que provocaram acidentes fatais. Esse número será relativamente baixo. Para a maioria das pessoas, são casos isolados, que apenas acontecem fora de seu núcleo de relacionamento e a manutenção do status social, do exibicionismo, não permite a mudança de hábito no sentido de se utilizar táxi ou uber para retornar para suas casas.
O risco porém, existe a cada copo de cerveja ingerido, mas as pessoas pensam que são imunes ao risco. A efetiva aplicação da lei indistintamente talvez seja a única forma de conter os números e mudar o comportamento das pessoas.
Ouvi na Rádio USP uma entrevista com o professor do Departamento de Psiquiatria, Ricardo Abrantes do Amaral, falando sobre as razões de as pessoas continuarem bebendo e dirigindo e não há novidade no diagnóstico: imaturidade, irresponsabilidade e falta de consciência.
O comportamento ético nem sempre é definido dentro dos limites da lei. A ética estabelece padrões amplos de comportamento e a lei nos diz o que estamos proibidos de fazer e nos impõe obrigações. Valores éticos e legais não são valores correspondentes, tampouco idênticos. Podemos considerar inaceitável algo estabelecido como lei e podemos ansiar por fazer algo que pode não ser legal.
A ética nos fornece guias sobre o que é a coisa certa a fazer em todos os aspectos da vida, enquanto a lei geralmente fornece regras mais específicas para que as sociedades e suas instituições possam ser mantidas. A ética envolve nosso pensamento e também nossos sentimentos, incluindo a culpa.
O cumprimento da lei, embora fundamental, não extingue o dever de agir no interesse público e de acordo com os princípios éticos, sobretudo quando consideramos os últimos casos ocorridos em Cuiabá, envolvendo pessoas, cujas profissões deveriam ser exercidas por bons cidadãos; servidora pública, professora, médica, juiz, etc…
Que bom que estamos vivendo um tempo de notícias 24 horas por dia, exposição de fatos da vida cotidiana, com imagens em tempo real e isso é uma característica importante para trazer à luz fatos que poderiam ser ocultados. Falta, porém, a punição exemplar.
Você bebe e dirige porque sabe que esse comportamento é socialmente aceito?
A. De jeito nenhum. Eu não descumpro a lei, não importa a razão.
B. Eu consideraria isso, mas provavelmente não faria.
C. Sim, sei que não causarei acidente nem serei pego.
D. Definitivamente faço, e tenho vários amigos que fazem também.