Há várias contribuições para o plano de governo dos candidatos a prefeitos, sobretudo no sentido de tornar as cidades mais humanas, valorizando os espaços de uso comum e tentando, de certa forma, abolir a tendência ou a lógica dos projetos que marcam a divisão entre centro e periferia.
O arquiteto Jaime Lerner, que foi governador do Paraná por dois mandatos e prefeito de Curitiba por três, lança um livro com ensinamentos valiosos sobre mobilidade e racionalidade no uso dos espaços públicos e, em entrevista, acerta um alvo: os candidatos que pretendem ir além de administrar recursos e obras carimbadas com selo do governo federal.
Diz ele que os gestores continuam a incentivar a criação de bairros distantes, que são alcançados apenas por carro, muitos nem linha de ônibus tem.
Lembra Lerner que mobilidade significa colocar moradia perto dos locais onde se acha emprego, pois levar infraestrutura para longe custa uma fortuna e a dependência de carro leva esta categoria de residentes, a se endividar para adquirir automóvel. A onda é explorar a dinâmica da cidade humana e promover soluções para os problemas urbanos e não sublinhar problemas deletérios.
Lerner condena a moda de se criar uma mini cidade dentro dos condomínios, onde se tem espaço para tudo, dentro dos limites dos muros altíssimos e convivência limitada a classes sociais distintas. Em vez disso, propõe, a reorganização de determinadas ruas, para que sejam espaços vivos, de cultura, compras e lazer, só assim, as pessoas sentirão vontade de viver suas cidades. Poucos exemplos em Cuiabá: talvez São Gonçalo Beira Rio e a Praça da Mandioca.
Ao comparar as gestões de prefeito e governador, assegura ter sido melhor prefeito, pois pode trabalhar diretamente com a sociedade e as experiências mostraram resultados com menos tempo, o que permitiu que as equipes trabalhassem mais rápido e mostrando resultados efetivos em vez de gastar tempo adaptando projetos nacionais, concebidos sem análise acurada das especificidades locais.
Ao estudar Geografia Humana tive a oportunidade de despertar para os ensinamentos do grande mestre, o geógrafo Milton Santos, que diz que a vida metropolitana deve sempre ser refeita, tanto na forma quanto no dinamismo, para não acabar compartilhando espaços plenos de tédio, angústia e medo.
Assegura que os condomínios caros são construídos longe do centro da cidade, justamente para empurrar os pobres para mais para longe ainda. E aí, voltamos ao Jaime Lerner, quando falou que os espaços públicos da periferia há muito são demarcados por obras de escolas, creches, postos de saúde e igrejas, que funcionam sem nenhum sentido de rede solidária.
Ser prefeito da cidade de Cuiabá hoje é não temer abraçar as adaptações rumo a modernidade, o que significa, entre outras coisas, construir um futuro atraente, mais informal e democrático para seus residentes. Hoje em dia, nos meios de aferição da qualidade de vida nas cidades, o que conta, não é o número de carros que trafegam pelas ruas e sim, o planejamento para tornar a vida dos seres humanos mais feliz.