Fidelidade partidária II

No período democrático de 1946-64 não havia restrição para a troca de filiação partidária, as mudanças ocorreram, porém, com pouca intensidade. Eminentes figuras da política brasileira estiveram sempre ligadas a um mesmo partido: Getúlio Vargas, João Goulart e Leonel Brizola ao PTB; Tancredo Neves, ao PSD; Carlos Lacerda e Afonso Arinos à UDN, diz o texto publicado pela Consultoria Legislativa do Senado Federal.

As trocas de partido vêm marcando a política brasileira desde a redemocratização do país, em 1985. Mas o STF já mostrou que é a favor da fidelidade partidária, embora coubesse muito mais ao Congresso do que ao Supremo disciplinar essas incongruências estruturais. Lendo artigos e observações de juristas e políticos, entre os quais, Paulo Brossard, Franco Montoro, Michel Temer, Dalmo Dallari e Gilmar Mendes, percebi a preocupação com as consequências que essas migrações causariam, entre elas, o enfraquecimento dos partidos políticos, o rompimento da relação ideológica com os eleitores e a contaminação do processo democrático. Embora seja um erro grave, por aqui não se vota em partido, vota-se em pessoas, porque o cidadão não percebe que o partido é seu complemento. Porém, a individualização começa no interior das convenções partidárias, que escolhem os candidatos.

Não sei qual seria o grau de satisfação dos eleitores com os partidos brasileiros, mas é certo que há um distanciamento entre dirigentes partidários e seus filiados, mesmo políticos eleitos; imagine, então, com o filiado que não detém mandato. Temos hoje 30 partidos registrados no site da Justiça Eleitoral e mais alguns com registro em andamento. Muitos com programas idênticos, outros, vagos, sem atuação relevante e marcados por decisões oportunistas, mas todos em prontidão para requerer o mandato do eleito que deixar o partido. Nessas condições, mesmo sujeitando-se ao rigor da lei, não se pode esperar outra coisa senão a vontade de mudar de partido.

Há de se considerar esse outro extremo em que os políticos ficam reféns daqueles que controlam as executivas partidárias. Deveria haver certo equilíbrio na legislação, onde os partidos tenham real influência sobre o comportamento dos políticos eleitos por suas siglas, mas também dificultar que os ocupantes de cargos eletivos fiquem à mercê dos dirigentes. É estranho observar que o sistema eleitoral prevê fidelidade a um membro do partido, enquanto do próprio partido não é cobrado coerência e fidelidade, na formação das coligações, por exemplo. Vê-se então que os pretensos infiéis não são os únicos vilões, pois muitos deixam o partido por não encontrarem espaço dentro dele, por serem excluídos de suas decisões e posicionamentos.

È inegável que grande parte dos parlamentares brasileiros pensam mais em seus interesses individuais do que no interesse do partido e no bem-estar dos eleitores que os elegeram. E não vai aqui nenhuma linha contra o Instituto da Fidelidade Partidária, o questionamento é sobre a ditadura que se impõe aos políticos, que uma vez eleitos por um partido, sem punição, é impossível mudar. Não se pode vislumbrar novos rumos, aderir a uma outra linha de pensamento, talvez seja este o único relacionamento fadado a durar até que a morte os separe, partido e eleito. Quanto ao mandato, bem, se pertence ao partido apenas, o político não pode perder o que nunca teve.

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