Com população estimada em 18 milhões de pessoas, o Chile vai se tornar o primeiro país do mundo a ter a constituição escrita por mulheres em número igual ao de homens. O plebiscito aprovado em 20 de outubro do ano passado, previu a eleição de um grupo de 155 cidadãos especialmente eleitos para serem membros da Convenção Constitucional, com cotas para garantir a diversidade e equidade. Isto parece proposital para diminuir a influência da elite política, dominada basicamente por homens e dar voz as mulheres, no futuro.
Ou seja, os chilenos terão uma Constituição elaborada por um grupo formado por 50% de mulheres. Será a primeira do mundo, a primeira de todos os tempos, a primeira de muitas, esperamos que sirva de modelo para a América Latina!
“Nunca mais sem nós”, foi o grito de demonstração de força das mulheres chilenas que ecoou pelo país em atos de protestos desde 2019. As mulheres têm sido a força progressista na campanha por mudanças no país, afirmando que a constituição atual não as representa nem garante a elas igualdade.
E as conquistas começaram a acontecer depois que vários comícios feministas foram organizados para protestar contra feminicídios, violência em geral contra as mulheres, mas não apenas isso, protestavam também contra o que consideravam desinteresse do estado para debater o tema e enfrentar o problema e investir numa política pública que pudesse fornecer estrutura legal para proteger a vida das mulheres. O movimento feminista chileno assumiu o protagonismo nas manifestações, aliaram-se direita e esquerda e pressionaram a classe política, que sem alternativas, apoiaram a convocação do plebiscito.
Semana passada, as eleições confirmaram os 155 cidadãos constituintes, representantes de todas as regiões do país, eleitos por um período de dois anos, que terão a responsabilidade histórica de escrever a nova constituição, instruída a fazer história na igualdade de gênero na política. Foram eleitos muitos convencionais sem nenhuma vinculação com partidos políticos ou coalizão, um recado claro que a força política tradicional não está sintonizada com o discurso e vontade do cidadão.
Pelas entrevistas lidas, a maioria dos chilenos celebram a vitória do plebiscito, a eleição dos cidadãos que irão escrever a constituição e veem nessa conquista uma oportunidade para reparar as desigualdades sociais e o estabelecimento de política de maior reconhecimento a história dos povos indígenas. No contexto do avanço da participação das mulheres na política, é extremamente poderoso e contagiante o grito das mulheres chilenas.
Ao ler sobre o protagonismo das mulheres chilenas, foi impossível não trazer a lembrança o ano de 2014, quando tive a imensa alegria e responsabilidade de organizar a vinda da Presidente do Chile, Michelle Bachelet a Cuiabá, para a abertura dos jogos da Copa do Mundo. Visita a Embaixada do Chile, visita de encarregados da missão diplomática do Chile, escolha do cardápio para o almoço oficial, convidados, carta de vinhos.
Preocupação de outros, a segurança, a estrutura de veículos e a entrada da Presidente na Arena Pantanal para o jogo de abertura Chile & Australia. A equipe de segurança da presidente nos interpela e alivia a tensão dizendo que a presidente não entraria por nenhuma porta especial destinada a autoridades. Ela chegaria na Arena Pantanal no ônibus com os jogadores da seleção chilena.
A chegada da Presidente redobrou a admiração. Sorriso farto, gestos largos, fala alta, rodeada de crianças pobres, que escolhera para fazer parte da sua comitiva oficial. Uma mulher inspiradora! Médica pediatra, mulher separada que criara sozinha 3 filhos, duas vezes Presidente do Chile, foi Diretora da ONU para questões das Mulheres e atualmente é alta-comissária da ONU para os Direitos Humanos.