Quando casais se distanciam, nunca é repentino

Fomos socializados para acreditar e buscar um futuro feliz para sempre em todo relacionamento significativo. Mas o que acontece quando o amor, qualquer que seja a sua categoria e classificação, se dissolve sob as forças indomáveis ​​do tempo e da mudança? No meio do que parece ser uma perda impossível de sobreviver, como podemos nos amarrar ao fato de que mesmo as coisas mais belas e mais singularmente gratificantes da vida são meramente emprestadas do universo, concedidas por um tempo, depois se vão, inexoravelmente? 

Causa estranheza tantas manifestações ocorridas acerca do fim de alguns relacionamentos de famosos ocorridos durante a semana. Nada é fixo. Nada é permanente, para ninguém. Apreciar e compreender a vida em cada instante é uma arte a ser praticada. Cada vez que sofremos uma desilusão estamos mais perto da verdade porque se fomos iludidos é porque não estávamos plenamente atentos. Quando os casais se distanciam, nunca é repentino.

No mundo moderno e líquido, uma relação pode ser vista como uma transação, uma coligação de interesses confluentes, e nesse mundo fluido as coligações tendem ser flexíveis e frágeis. Se acharmos que precisamos fazer com que cada momento seja profundo, significativo e eterno, arruinaremos o relacionamento. Há uma afirmação budista(Koan) sobre o esforço demasiado para fazer um relacionamento dar certo: “o fim pode vir a qualquer hora, relaxe.”

Relações estagnadas não valem a pena, tampouco relações de conflitos e nem sempre é possível dar nova vida ao relacionamento, seja curto ou longevo. Separar-se dói, confunde, mexe com sonhos e estruturas básicas dos envolvidos. Recorro a minha descrença com relacionamentos que dispendem de grande energia e pirotecnia verbal, como a tradicional hipérbole “eu quero ficar com você pelo resto da minha vida”, para lembrar que os seres humanos, imperfeitos, impermanentes e confusos, com raras exceções, inevitavelmente vão te decepcionar. 

Sobre amor e relacionamento, a história que me fala a alma é contada também por um famoso, pelo escritor colombiano Gabriel Garcia Marquez no livro “O amor nos tempos do Cólera”. Uma irretocável história que se estendeu por mais de cinco décadas de amor e espera entre Fermina Daza, filha de um dos mais importantes homens da cidade e Florentino Ariza, um menino simples e puro.

Proibidos de se encontrarem, aos 20 anos, ela se casou com o médico da cidade, Juvenal Urbino, dedicado a pôr fim à epidemia do Cólera. Florentino tomou a decisão de esperar por Fermina o tempo que fosse necessário e estabeleceu com ela um sistema de trocas e juras de amor através de cartas e telegramas.

Florentino dedicou sua vida ao seu amor, mas enquanto esperava contabilizou cerca de seiscentos e vinte e duas (622) aventuras amorosas fugazes. Ela sabia que ele a amava mais que tudo no mundo. Eles estavam de certa forma juntos em silêncio além das armadilhas da paixão, além do próprio amor. Amor, que em Florentino, doía o corpo, como os sintomas do Cólera.  

53 anos, quatro meses e 11 dias depois morreu o Doutor Juvenal Urbino. Florentino aproximou-se de Fermina e sussurrou: “Eu esperei por esta oportunidade há mais de meio século para repetir para você o meu voto de amor e eterna fidelidade.” Tempos depois, Florentino recebeu um envelope com um bilhete de uma só linha que dizia: “Está bem, me caso com o senhor”.

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