Sinais ameaçadoramente contemporâneos

Em uma semana estaremos votando no segundo turno da eleição presidencial. Sempre temos escolha: podemos deixar que as circunstâncias de nossas vidas nos endureçam e nos tornem cada vez mais ressentidos e temerosos, ou podemos deixar que elas nos abrandem e nos tornem mais tolerantes e gentis. Eu escolhi abri mão do voto secreto e me posicionei sem discutir, sem invadir a privacidade de nenhum amigo para criticar ou atacar e na mesma linha também não permiti invasão nas minhas páginas para me questionarem. O tempo todo dessa interminável campanha, eu fui civilizadamente fiel às minhas convicções e cuidadosa no trato com as pessoas. 

Para acalmar a incerteza e preencher lapsos de ignorância, recorri à leitura. De forma desordenada cronologicamente, ia de “As origens do totalitarismo”, de Hannah Arendt à Platão, que catalogou algumas formas de governo experimentados pela humanidade, até o best-seller dos cientistas políticos americanos, “Como as democracias morrem”. Assustada, assinalava as coincidências encontradas nos fragmentos de nossa democracia, que foram ficando pelo chão.

Ao ler o título do último capítulo de ‘As origens do totalitarismo’, parei e pensei: sim, é isso que estamos vivenciando: Ideologia e terror: uma nova forma de governo. Não temos um presidente governando a nação, temos um homem obcecado pelo estabelecimento de padrões morais, escorados na família tradicional, na fé e patriotismo cegos, independentemente de o governante, ele mesmo, ser um bom cristão, cultivar valores morais no seio da família. Nessa perspectiva, importante é incutir e pregar a moralidade como uma ideia central, mas ser, de fato, um cidadão moral, não vem ao caso. 

Bolsonaro teceu uma estratégia de investir fortemente no apelo cristão e messiânico, dando ‘evidências públicas de ser um bom cristão’, ao mesmo tempo em que reverbera o desprezo pelas minorias, pelos pobres, pelos que não são conservadores, então, tem pregado para seduzir e mobilizar sua base religiosa conservadora.

Uma implicação interessante na análise de Arendt é que o governante totalitário normalmente não é justo ou sábio; ele é simplesmente aquele que veio para quebrar conscientemente o consenso, colocar o pé na porta das instituições que regulam seu poder. Exatamente como aqui, agora, há uma grande massa disposta a renovar a compra de uma narrativa que os enfeitiçou quatro anos atrás e que transcende a compreensão de valor e de realidade. 

Embora as observações de Hannah Arendt, obviamente não podem explicar tudo sobre os complexos desenvolvimentos políticos de hoje, não deixam de ser reveladoras, pois fornecem informações sobre os mecanismos que permitem que tantas pessoas aceitem prontamente viver de mentiras. “Num mundo incompreensível e em perpétua mudança, as massas haviam chegado a um ponto em que, ao mesmo tempo, acreditavam em tudo e em nada, julgavam que tudo era possível e que nada era verdadeiro”.

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